Mototaxista aluga área pública em praça de Belém
Belém PA, Estacionamentos públicos em Belém estão sendo apropriados, como no caso de 22 vagas atrás da Praça da Sereia, em frente a uma grande loja varejista, na avenida Presidente Vargas, uma das mais movimentadas de Belém. As vagas são alugadas para quatro flanelinhas, que se revezam de segunda a sábado no espaço. Segundo os flanelinhas que não quiseram se identificar, para trabalhar no local eles pagam R$ 130 por dia. A divisão do 'aluguel' é de acordo com a quantidade de vagas: os que tomam conta de 12 vagas pagam R$ 70, os outros que possuem 10 vagas alugam por R$ 60. O homem que se reivindica 'dono do ponto', localizado em uma área pública no centro de Belém, é Ruster Pantoja Gonçalves, conhecido pelo apelido de Chuchu, que chega a faturar R$ 3 mil por mês, calculados os dias de trabalho, mais o preço das diárias pelo aluguel. Os guardadores dizem que, quem não paga a taxa, não é liberado para trabalhar. A reportagem flagrou o momento em que guardadores pagavam as diárias, rotina cumprida todos os dias, entre 15h30 e 16h, horário em que Chuchu aparece para verificar como está a situação na área que ele controla.
Ruster diz que 'ganhou' o estacionamento do pai, Rui Bessa da Cunha Gonçalves, que trabalhou na área por 20 anos como flanelinha. “Ele (Rui) lavava, reparava e tomava conta dos carros e do estacionamento”, conta um dos flanelinhas, que não concorda por ter de pagar para trabalhar em um local público, mas se conforma. 'Tá errado, porque se não pagar ninguém trabalha. O ponto é dele'. Quando indagado sobre os momentos de fiscalização, o guardador diz que Roster mostra seu crachá de credenciado da Associação dos Trabalhadores Guardadores de Veículos de Belém. 'A prefeitura finge que não sabe. Quando a CTBel vem, só ele é legalizado', afirma.
Se qualquer problema ocorrer no espaço, Ruster aparece para resolver a situação. 'Se uma pessoa 'dizer' que nós roubamos, ele aparece, porque ele não quer bagunça no ponto dele. Ele é bacana. Se algo quebrar ele paga, se roubarem palheta, ele paga', diz o flanelinha, que não tem outro meio para viver e teme ter que sair do estacionamento. 'Aqui é muito difícil ter queixa', complementa ele, que não tem nenhum direito trabalhista.
No mês passado, a Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa) cortou a ligação clandestina de um poço na praça da Sereia, ponto que era utilizado como lava-jato irregular. A quantidade de lavagens de veículos diminuiu. Outro flanelinha, que também não quis se identificar, explica que houve uma negociação para reduzir o pagamento pela metade, por causa do corte da água. 'Quando a gente tinha o poço pagava R$ 130 cada um, depois a gente negociou e um paga R$ 70 e o outro R$ 60', explica. O guardador informa que consegue normalmente cerca de R$100 por dia. Os trabalhadores se revezam: dois trabalham às segundas, terças, quintas e sábados, outros dois às quartas e sextas.
Ruster confirma que recebe uma 'ponta' dos guardadores, mas contesta os valores. 'O papai deixou o ponto na minha mão, na minha folga eu venho para cá. Eles deixam de R$ 20 a R$ 30', relata Chuchu, que trabalha meio período como mototaxista. O dinheiro ele diz que é para comprar material de limpeza, como esponjas e sabão. Para ele, a acusação 'é de nego que tem inveja'. Ele conta que voltará à área, pois o pai trabalha atualmente com frete no Ver-o-Peso e está doente para lavar carros. Ruster diz ainda que ninguém estipula preços para os guardadores.
Delegada do Comércio diz que caso pode ser enquadrado como extorsão
A delegada da seccional do Comércio, Socorro Picanço, avalia que a cobrança pelo aluguel de uma área pública pode ser enquadrada como crime de extorsão, capitulado no artigo 158 do Código Penal, caso os flanelinhas sejam obrigados a fazer o pagamento. A pena pode variar de quatro a 10 anos de prisão e multa. A delegada diz que se, houver denúncia, irá apurar o caso. 'Nós não temos nenhuma ocorrência colocando essa situação. Esta é a importância de fazer a denúncia. Ele poderá responder por isso criminalmente', informa.
O presidente da Associação dos Trabalhadores Guardadores de Veículos de Belém, Ronivaldo Andrade, diz que tem conhecimento do caso do estacionamento da praça da Sereia, mas alega que não pode fazer nada. 'A associação não concorda, mas nós não temos instrumentos legais para dizer que a prática é irregular. A hora em que essas pessoas vierem até o sindicato, nós daremos todo o apoio jurídico', disse. Para Ronivaldo, a relação estabelecida entre Ruster e os flanelinhas deve ser de garantia de direitos. 'Essas pessoas estão recebendo ordem. A lei trabalhista diz que se há subordinação à ordem de outrem, a pessoa está prestando trabalho indireto. Eles têm um acordo recíproco. Ele está alugando a rua, mas está à mercê da lei trabalhista', avalia.
Ele garantiu que os trabalhadores, que pagam o aluguel, poderão se cadastrar na Associação sem nenhum problema e trabalhar no ponto. De acordo com Ronivaldo, a prática não é comum em Belém. Ele atribui a responsabilidade pela desordem à Autarquia de Mobilidade Urbana (Amub). 'A Amub está se eximindo da ordem deles. Ela tem que ter um estudo do tráfego. Quando é para implantar a Zona Azul, não é com ela? É por isso que está acontecendo essa prática. Não há divisão no órgão para tratar com os flanelinhas', critica. Para ele, os guardadores de carros devem ser vistos como aliados da segurança pública e não como inimigos.
A Amub informou que não fala sobre casos com flanelinhas, pois sua atribuição é organizar o trânsito e assegurar estacionamento. A Coordenadoria de Comunicação Social (Comus) da Prefeitura de Belém (PMB) informou que a Secon já notificou três vezes os guardadores do estacionamento citado, mas não tem poder legal para impedir o aluguel.
Fonte: O Liberal
Foto: Fábio Costa (O Liberal)
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