Celular pode ser mais perigoso que álcool no trânsito
O motorista que utiliza celular enquanto dirige tem quatro vezes mais chances de causar um acidente do que um condutor embriagado. A estimativa é do Departamento Estadual de Trânsito do Pará (Detran-PA), com base em vários estudos publicados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Medical New England Journal of Medicine (revista britânica de medicina). Pesquisa do Detran-PA aponta que 70% dos condutores dirige com o celular ao alcance. Destes, 41% fazem de uma a cinco chamadas enquanto dirige. Outros 30,5% fazem de 16 a 20 ligações no trânsito. A perda de controle, manobras irregulares ou falta de atenção estão são as três principais causas de acidentes. Em pelo menos 80% destes casos, o uso de celular pode ter colaborado para o acidente. No ano passado, a Companhia de Transportes do Município de Belém (Ctbel) aplicou 14.282 multas por uso de celular no trânsito.Em 2010, o Detran-PA registrou 6.493 acidentes causados por manobras irregulares, 1.897 pela perda de controle e 2.891 pela falta de atenção. Juntas, estas causas somam 11.281 acidentes. Em pelo menos 9 mil dessas ocorrências o uso de celular pode ter sido a causa. Isso seria mais que todas as ocorrências de desrespeito à preferencial (1.198), dirigir na contramão (622), excesso de velocidade (699), embriaguez alcoólica (688), desviar de veículo (540), desviar ou chocar-se com animal na pista (539) registradas no mesmo ano, que somam 4.286 acidentes. Com esses números, acidentes envolvendo o uso de celular são 13 vezes mais frequentes que acidentes envolvendo a embriaguez. Por outro lado, alguns dos acidentes mais graves são relacionados ao uso do álcool. Os dados de 2011 e 2012 ainda não estão fechados.
Com um celular em mãos, o condutor perde a acuidade visual (impedindo de ver a situação do trânsito), auditiva (dificultando ouvir buzinas e apitos) e tem o tempo de reação reduzido drasticamente (que deve ser de três quartos de segundo). Esse tempo é o necessário para pensar e agir diante de determinadas situações, como fazer um retorno, perceber um aviso ou desviar de um veículo ou animal.
Leia amanhã, na sétima reportagem da série sobre a Semana Nacional do Trânsito, como dirigir não se trata de uma necessidade e que pode ser hora de deixar o carro em casa em prol da saúde.
Aparelho se torna acessório dos carros - O coordenador de Planejamento do Detran-PA, Carlos Valente, ressalta que o celular tem se tornado acessório do carro, pois muitos condutores constantemente manuseiam o aparelho. E com esse perigoso hábito, o número de acidentes 'misteriosos' aumentou. Mas como as equipes de levantamento de acidentes de trânsito (perícia) demoram a chegar, é difícil provar que o celular foi a causa. O condutor na maioria das vezes diz que perdeu o controle do veículo ou não prestou atenção. Na opinião dele, o ideal seria que as equipes de perícia chegassem mais rápido e tivessem um médico e um psicólogo para detectar as causas do acidente de forma mais precisa. Uma das características desses acidentes, é que não foi feito uso do freio pela redução do tempo resposta.
'Quando um condutor está falando ao celular, fisicamente ele está no veículo, mas psicologicamente não. Conversar com um passageiro ou ouvir música não desviam tanto a atenção, mas o celular exige que você olhe e manuseie o aparelho. Ao passar uma mensagem ou e-mail, o risco de acidentes é de 100%. Um condutor embriagado e falando ao telefone tem oito vezes mais riscos de cometer ou sofrer um acidente. Usar o fone ainda é infração também e causa a inibição da audição, dificultando ouvir buzinas e outros ruídos', alerta Valente.
Quando o condutor esta usando o celular, geralmente dirige numa velocidade baixa, faz mudanças bruscas de faixa, deixa o carro 'dançando'.
Penalidade branda faz código ser ignorado pelos motoristas
Carlos Valente afirma que a penalidade muito branda faz com que muitos não se importem e continuem cometendo essa infração, que é considerada média. A punição é de R$ 85,13 e quatro pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH). 'Além da infração, é necessário ressaltar o risco. Acho que seria interessante se as operadoras fizessem campanhas sobre não dirigir com celular, assim como se faz com bebidas alcoólicas. O perigo do celular está preocupando os órgãos de trânsito', concluiu.
Além de prejudicar os sentidos de um motorista, o celular pode reduzir a concentração e produtividade em outras atividades fora do trânsito, como trabalho e escola. Com as funcionalidades dos aparelhos, cada vez mais pessoas os utilizam como ferramenta para trabalhar ou estudar. Mas com tantas funções de entretenimento, como internet, mensagem, música, jogos e acesso a redes sociais, a distração pode ser muito grande, fazendo com que a pessoa perca o interesse no que está fazendo.
O psicólogo doutor em Psicologia, Teoria e Pesquisa do Comportamento João Bosco de Assis, ressalta que ao usar o aparelho celular, a pessoa fica com a atenção distribuída para mais de uma atividade. A intimidade com os aparelhos faz inclusive com que as pessoas cometam gafes, como atender o telefone no meio de uma conversa, reunião ou aula. 'Claro que um telefone perturba outras atividades e interrompe a comunicação entre indivíduos. No trabalho se reduz a produtividade. Na escola, reduz a concentração e o aprendizado', disse.
No trânsito, interrupções e distrações podem ser fatais. Bosco lembra que a legislação de trânsito exige que o condutor dirija com as duas mãos.
O psicólogo coordena um grupo de apoio para pessoas com dificuldades para dirigir, que funciona na Universidade Federal do Pará (UFPA), o Pró-Dirigir.
O celular é uma ferramenta íntima da universitária D. D., de 19 anos. Tão íntima que ela não consegue largar quando dirige. Com carteira nacional de habilitação (CNH) há exatos 10 meses, ela confessa que no trânsito, só desligou o telefone no dia da prova prática do Detran-PA.
Fonte: Jornal Amazônia
Foto: Elivaldo Pamplona
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