VOCÊ JÁ FOI ENTREVISTADO?
Por : Maurício Costa Romão
“Tenho 76 anos, eleitor desde os anos 50, e acho muito estranho jamais ter sido procurado por um Instituto de Pesquisas para uma declaração de voto. E os senhores, que neste momento lêem esta carta, já foram procurados alguma vez por esses institutos? Esta pergunta prende-se ao fato de que, num universo de aproximadamente 250 eleitores da cidade onde moro, Volta Redonda, não encontrei uma só pessoa que tenha sido pesquisado. Até quando vamos deixar os institutos elegerem os candidatos?” Leônidas Marques - leo_vr@terra.com.br.
O texto que encabeça o presente artigo foi enviado a um importante jornal de capital brasileira para a seção de “Cartas à Redação”, sob o título de “Institutos”. Na singela missiva sobressai-se o desapontamento do Sr. Leônidas pelo fato de nunca ter sido entrevistado por uma pesquisa eleitoral.
Como o Sr. Leônidas, inúmeros outros eleitores compartilham do mesmo desalento. Observam que pesquisa vai, pesquisa vem, e nunca são entrevistados, por qualquer que seja o instituto. Indagam sobre isso em seus círculos de convivência e, surpresos, constatam que ali, também, ninguém foi abordado por tais levantamentos. Daí para inferirem, como o fez o Sr. Leônidas, que as pesquisas são fabricadas é um pulo!
Apesar das justas dúvidas que assistem ao Sr. Leônidas e aos demais eleitores com quem divide tais inquietações, o fato de eles nunca terem sido entrevistados é perfeitamente compreensível e explicável, do ponto de vista estatístico e probabilístico.
As pesquisas de intenção de voto são amostrais, consultam apenas uma pequena parte da população. Daí por que ser raro, muito raro, um determinado eleitor fazer parte de uma dessas amostras aleatórias.
Veja-se, por exemplo, o caso brasileiro, que tem um universo de 140 milhões de eleitores (TSE, 2012). No país, é comum os institutos de pesquisa fazerem levantamentos nacionais de 2.000 entrevistas. O eleitor deveria perguntar-se, então: “sendo eu apenas um eleitor em 140 milhões, qual é a minha chance (probabilidade) de ser entrevistado numa amostra de 2.000 questionários?”
Para seu espanto vai descobrir que a probabilidade de ele ser entrevistado é baixíssima (0,0014%): apenas um eleitor tem essa chance em cada grupo de 70.000! Ou seja, seriam necessárias 70.000 pesquisas, com amostras de 2.000 eleitores, para que os pesquisadores pudessem entrevistar todo o eleitorado brasileiro. Isso considerando ainda que nenhum eleitor fosse pesquisado mais de uma vez.
Naturalmente, quanto menor é o universo de eleitores maior é a chance de uma pessoa ser entrevistada, para um mesmo tamanho de amostra. Por exemplo, num estado como Pernambuco, com 6,5 milhões de eleitores em 2012, se os institutos fizerem pesquisas utilizando também 2.000 questionários, uma pessoa será pesquisada em cada grupo de 3.250 eleitores.
Em outras palavras, para uma aplicação de 2.000 questionários, a chance de um eleitor ser pesquisado em Pernambuco é cerca de 21,5 vezes maior do que a de um eleitor sê-lo no Brasil. Ainda assim, não é fácil encontrar um eleitor pernambucano que haja sido entrevistado.
Em Volta Redonda, município relativamente pequeno, onde mora o senhor Leônidas, ele mesmo relatou as dificuldades de ser entrevistado por lá. Com um universo estimado, em 2012, de 217 mil eleitores volta-redondenses, uma pesquisa de 500 questionários, por exemplo, dá uma chance a seu Leônidas de vir a ser abordado por um pesquisador de tão somente 0,23%, que dizer, uma chance em cada 434.
Enfim, o senhor Leônidas nunca ter sido entrevistado é uma fatalidade da estatística. Aconteceu também com milhares de outros cidadãos que gostariam de participar do processo eleitoral mediante manifestação de suas preferências diretamente nas entrevistas levadas a cabo pelos institutos de pesquisa.
Sendo essa possibilidade muito remota, só resta ao eleitor não abordado pelas pesquisas resignar-se e sentir-se como se entrevistado fora, já que suas opiniões, embora não reveladas, estarão representadas através das manifestações daqueles que foram afortunadamente contemplados pelo acaso probabilístico.
Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e Institucional, e do Instituto de Pesquisa Maurício de Nassau. mauricio-romao@uol.com.br http://mauricioromao.blog.br.
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